“A barata diz que tem sete saias de filó.
É mentira da barata. Ela tem é uma só...”
Pois é, a barata deste conto maravilhoso fabular não tem motivo para vangloriar-se. Pelo contrário, mora numa lata velha enferrujada, sofre humilhações e até foi despejada.
O autor, Anderson de Oliveira, por meio de uma linguagem simbólica e bem cuidada, se vale do seu olhar sensível e perspicaz para problematizar a vida, evocar os dramas humanos e desvelar o poder das aparências.
Mas nem só de descompassos vive a barata. Elementos lúdicos, também carregados de emoção, aparecem em tramas simples como o destino: ora baratinada, ora entregue às baratas, a personagem reconhece que viver é o maior barato, dá a volta por cima, depois de intitular-se “sócia” na loja do Português mais barateiro do pedaço.
A obra em questão convida o(a) leitor(a) de qualquer idade a acordar pensamentos por vezes adormecidos entre a correria e os desmazelos do tempo. Moradia precária, desigualdade social, zombaria, artimanha e hipocrisia se digladiam com a resistência e a determinação de assumir o próprio caminho.
Só a fascinação e a sagacidade de um bom escritor nos despertam para essas e outras tantas percepções.
Neusa Sorrenti